segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

3 – Casas-Museu de Personalidade

Moderador: Dr. António Ponte


O Dr. António Ponte começou por apresentar qual o objectivo do Grupo de Trabalho visando-se, então, o debate sobre o que representam os espaços e quais devem ser, ou não, Casas-Museu.
Para tal deveria proceder-se ao processo de categorização, inquirindo-se a pertinência da categorização, se o processo é operacionalizável em Portugal e qual a forma organizativa a ser adoptada.

Assim sendo, os objectivos seriam organizar (visto haver formas de trabalho e características muito diferentes e por não haver uniformidade quanto à terminologia), definir o que é uma Casa-Museu e distingui-las de outras estruturas análogas e identificar se os patronos que dão nome à Casa são passíveis de ser detentores da classificação (uma vez que sem Serviço Educativo, sustentabilidade, investigação, entre outras, não poderá ser verdadeiramente uma Casa-Museu).
Comentou-se que as Casas-Museu enfrentam uma conotação complexa, mesmo que identificando-se como necessária a correlação Casa-Colecção-Personalidade. Acabou-se mesmo por indicar que a versatilidade das Casas-Museu acaba por ser a sua grande característica, dando-lhes assim um papel menos claro e definido.
Neste sentido, o Dr. António Ponte expôs as cinco classificações pré-existentes. Perante as quais propôs uma fusão entre elas visto todas terem pontos de interesse e considerando que a distribuição dispersa de categorias não faz sentido num espaço geográfico como o Português.
Contudo, admitiu também que não existe um universo que permita enquadrar todos os modelos existentes e, para ilustrar este facto, indicou alguns exemplos dos tipos de Casas-Museu existentes: a Casa Original (local onde viveu a individualidade e onde a colecção tem uma ligação com a personalidade, apresentando características aglutinadoras da Casa Original - homem, casa, vivência e acervo - e que constata a “Casa-Museu [como] teatro de vida”, surgindo como elemento necessário o elemento vivência para haver enriquecimento, ou seja, tem que haver fundamentos que permitam e dinamizem a investigação); a Casa-Museu Constituída; a Casa-Museu de Época; a Casa Museu Estética ou de Colecção (onde não se “viveu” as peças e onde, muitas vezes, se criam ilusões de vivência “manipuladoras de realidade”) e as Period Room (como por exemplo, o Paço dos Duques de Bragança onde se recria o período dos Descobrimentos assente na ideologia por que se orientava o Estado Novo, constituindo-se como um espaço de “Memória construída”).
Além destes, há ainda os Museus Etnográficos, as Casas Típicas ou Modestas (casas que não têm vivência), os Museus de Arte Sacra, os Museus de Empresa e os Museus de Personalidade.
E além de todas estas categorias surgem ainda sub-categorizações que adensam a problemática da questão. Sendo, por exemplo, necessário distinguir “Casas-Museu de Personalidade” de “Museu de Personalidade”. E, também, encontrar uma definição de “Personalidade”, sendo que o Dr. António Ponte apontou como definição alguém identificável no tempo, transversalmente, como alguém que influenciou o seu tempo. Todavia surge o problema na identificação quanto ao nível de incidência da influência da personalidade, ou seja, se se enquadra a nível local, regional, nacional ou internacional.
Além disto referiu-se que, no Museu de Personalidade, é necessário haver investigação pura e dura, de modo a que haja um enquadramento no espaço da personalidade, para se saber o que fez, quem influenciou, quem o influenciou e deverá desconstruir a personalidade para se poder mostrar a personalidade.
Foram ainda referidos os Museus de História (como por exemplo, a Casa de Colombo), os Centros Culturais, de Estudo ou de Documentação e também as Casas-Museu de Personalidade considerando-se que estas deveriam deter um centro de interpretação.
Contudo, neste ponto referente aos centros de interpretação, contrapuseram com o exemplo da Casa-Museu Abel Salazar que apesar de não ter centro de estudos/interpretação conta com uma comunidade de académicos que fazem investigação, provando que existe a possibilidade de se atrair investigadores.
De seguida, mencionou-se a necessidade de se identificar se há condições nos espaços físicos para que se investigue (por exemplo, bibliotecas, meios de investigação, etc.) sendo que neste ponto o Dr. Manuel de Sampayo Pimentel Azevedo Graça, representante da Divisão Municipal de Museus da Câmara Municipal do Porto, identificou que a tendencial ligação das casas às Autarquias ou ao Estado constituem-se como facto prejudicial à sustentação de unidades de investigação.
Em resposta, o Dr. António Ponte reforçou a necessidade de categorização. Isto porque tal factor permitiria a criação de redes assentes em parâmetros comuns (por exemplo, tipologia), sendo que este factor conduziria a uma maior capacidade de reivindicação. Deu conta, por exemplo, da sua necessidade de requerer investigadores (técnicos superiores) ao Centro de Emprego.
Retomando o tema, o Dr. António Ponte deu como exemplo a Casa de Camilo, visto todo o espaço girar em volta da figura. E antes de devolver a palavra aos restantes elementos da oficina de trabalho com a pergunta: “O que é, para si, uma Casa-Museu?”, observou que um dos meios de se rentabilizar os recursos humanos dos espaços passava pela concessão de autonomia aos colaboradores, ficando a cargo da direcção a programação e deixando para os colaboradores a execução.
Observou-se que, para se conseguir fazer uma categorização de Casas-Museu, era necessário, primeiro, uma inventariação clara e cuidada de toda a rede. Só isto permitiria a categorização mesmo considerando que as categorias pré existentes podem não permitir o encaixe.
O Dr. António Ponte contrapôs indicando ser possível, antes de se proceder à categorização, dar-se pistas gerais para que se minimizasse o número de categorias sendo que, face às Casas-Museus que se apresentassem com características transversais, poder-se-ia identifica-las como Casas-Museu “Mistas”. Tomou por exemplo a existência das duas Casas-Museu dedicadas a José Régio, sendo elas totalmente distintas. Daí considerar que, para que se possa considerar formalmente uma Casa-Museu como tal, o espaço deveria reflectir a vivência da personalidade ao qual o espaço é afecto.
Em interpelação, o Dr. Manuel de Sampayo Pimentel Azevedo Graça, apresentou o exemplo da Casa de Guerra Junqueiro que não tem vivência e onde os espaços foram remontados, numa tentativa de reconstituição dos espaços. O Dr. António Ponte reafirmou a sua consideração de que a vivência é essencial visto só esse elemento permitir a identificação clara do espaço enquanto Casa-Museu. Assim, as ditas Casas-Museu que não têm vivência poderiam, simplesmente, passar a chamar-se “Museu”. Deu, por exemplo, a reestruturação da rede de Bibliotecas Nacional como um exemplo de sucesso na sua requalificação.
Tomou a palavra a Dr.ª Sandra Castro, representante da Casa-Museu de Monção da Universidade do Minho, de modo a ilustrar a especificidade particular do espaço que coordena. Trata-se de uma casa de burguesia do início do século XX que, apesar de estar sediada em Monção, é uma unidade cultural da Universidade do Minho. Quanto à montagem da casa, houve, em certos casos, a adaptação de espaços e, noutros casos, os espaços não foram mexidos, daí considerar que se trata de uma “Casa-Museu porque [ali] viveu uma pessoa”. Apesar de ser uma casa que visa ilustrar um espaço delimitado no tempo não é uma Casa de Etnografia.
O Dr. António Ponte retomou a questão da “Museologia e Autarquias”. Disse ter visitado em Santarém uma dita Casa-Museu que era, no fundo, um Museu Etnográfico. Ora, este elemento faz com que os visitantes não sintam a necessidade de voltar, defrauda-lhe as expectativas.
Tomou a palavra a Dr.ª Teresa Lopes, representante da Casa-Museu Anselmo Braamcamp Freire, dando o exemplo do espaço que coordena. Anselmo Braamcamp Freire viveu no espaço, mas depois a casa caiu no abandono, tendo posteriormente sido restaurada pela filha. Num momento posterior, a casa foi doada ao Município de Santarém sem espólio do próprio, mas tendo vindo as peças, manuscritos e Biblioteca da casa de Lisboa de Anselmo Braamcamp Freire.
De seguida, dá-se a instalação da Biblioteca Municipal no espaço, unindo-se com a anteriormente doada, até que no final da década de 50 notava-se uma maior preocupação com a biblioteca mesmo estando no espaço, por exemplo, cerâmicas, escultura e mobiliário. Hoje a casa é um aglomerado: biblioteca, Casa-Museu e reserva tratando-se, portanto, de um museu poli-nuclear. Tal poli-nuclearidade dificulta a gestão do espaço e a capacidade de categorização, visto que, além das muitas colecções e da colecção de arte da biblioteca, há ainda colecção de arte contemporânea instalada no espaço.
E terminou dizendo que, mesmo dentro da Instituição, não há consenso quanto ao facto de ser, ou não, formalmente uma casa museu. O Dr. António Ponte, em resposta, considerou que a solução talvez pudesse passar pela depuração do espólio para consignar o espaço somente à personalidade.
A Dr.ª Ana Paula Mota, representante do Museu de Alhandra - Casa Dr. Sousa Martins expôs o seu caso. Trata-se da casa onde Sousa Martins nasceu, mas onde há, apenas, uma sala que detém peças que lhe terão pertencido. Além disto, o espaço conta com uma biblioteca com alguns dos seus manuscritos, uma sala com peças de Alhandra, outra com peças de indústria do início do século XX e, também, uma sala para exposições temporárias. Trata-se, portanto, da Casa onde Sousa Martins nasceu, viveu, mas onde só lhe tem destinada uma sala.
Face a isto, o Dr. António Ponte indicou não considerar o espaço passível da nomenclatura Casa-Museu, visto não deter o espírito de Sousa Martins. Assim, a Casa poderia ter Sousa Martins como figura tutelar, mas não deveria ser chamada de Casa-Museu, visto estas deverem transportar os visitantes para os espaços domésticos que espelham a vivência e que tiveram um molde assente na personalidade. Daí o Dr. Manuel de Sampayo Pimentel Azevedo Graça indicar a dicotomia vivência - galerias de colecção.
Seguiu-se depois o exemplo da Casa-Museu Almeida Moreira, representado pela Dr.ª Sandra Alves, indicando que o espaço tem as paredes-mestras e a mesma estrutura e dentro da casa há peças que pertenceram a Almeida Moreira e da sua colecção particular.
O Dr. António Ponte interpelou-a no sentido de saber se o espaço não poderia chamar-se, apenas, Museu Almeida Moreira para que não se defraudasse as expectativas dos visitantes.
Outro representante do espaço observou que Almeida Moreira, ex-Director do Museu Grão Vasco, doou o espaço e espólio ao município e o Testamento identificava que o espaço seria uma Casa-Museu. Tratava-se de um memorialista, tendo desde peças extraordinárias a peças memorialistas e, com uma visão cosmopolita, definiu que queria Casa-Museu/Biblioteca que surgisse como uma espécie de “segundo Grão Vasco”.
Já nos anos 40 do século XX, a Câmara Municipal de Viseu entregou a Casa ao Estado e este entregou-a ao Museu Grão Vasco, sendo a gestão auxiliada pela Fundação Calouste Gulbenkian. Por opção da Gulbenkian não se alterou o a estética externa, mas remodelou-se o interior apresentando se o espaço com várias valências: o “espaço do senhor”, colecção de arte e ainda a sua documentação. Pondo isto, questionou se face a tal acervo e documentação poderia recriar-se a vivência da personalidade e espelhar-se a memória da personalidade. O Dr. António Ponte considerou que o espaço deveria ser Museu de Personalidade e não Casa-Museu de Personalidade.
Concordando, a Dr.ª Sandra Castro referiu que o cerne da questão era o defraudamento das expectativas dos visitantes. Neste sentido, o Dr. António Ponte afirmou que, por exemplo, o regime de acrílicos destrói o conceito de Casa-Museu. Tentou, por isso, sumariar questionando os demais se fazia sentido a categorização.
Nesta linha considerou que tal categorização jamais poderia ser restrita ao Encontro e, por se tratar de um processo, aludiu à criação de um blogue ou fórum online que permitisse ir além do encontro físico. Nessa linha, a Dr.ª Maria Luísa Garcia Fernandes observou que se poderia recorrer ao www.museologia.pt para que se estendesse o debate.

Conclusões:


- Criação de um Blogue para dar maior visibilidade às Casas-Museu;
- É necessário medir as diferenças entre as várias Casas-Museu de Personalidade existentes;
- Há um número excessivo de classificações e pode não se ter, a nível nacional, a capacidade de dar resposta à variedade de categorias existentes.

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